2 de novembro de 2006

O dia-a-dia no canaril da Luz

Em degraus ou andares tão direitos quanto o Empire State Building ou com uma ligeira inclinação como a Torre de Pisa, assim se erguem para o canto deste Inverno os Canários Carmelitas. O “Escolhido”, altaneiro, pouco se importando com a luminosidade da hora, desafia o mais distraído com o recorte dos seus vários timbres; “Baltazar”, mais habituado às lides caseiras e canaris responde de acordo com o seu tom terra e com ventos vindos de Espanha; o “Erbitas” não se envergonha e solta umas résteas de brisa que purificam o ar envolvente; o “Húnico “ com seu porte esguio e de branco vestido, reage por vezes envergonhado a toda esta competitividade. Num plano mais horizontal, o “Mariano” comanda as hostes a alguma distância contracenando com o “Ovo” numa melodia serôdia. Espantado fica o “Malhadinhas” do alto do seu 1º andar ditando prosa inspirada no Aquilino Ribeiro. O “Vega”, pai de todos, olha com sobranceria para toda esta canalhada, e de quando em vez solta o bico à “”, à “Dulce” e à “Sirius” (das que tenho conhecimento…), as quais, aparentemente distraídas, se vão passeando nos poleiros da moda.

Elegante e meiga, bonita de verdade, a “Carmelita” vai espreitando e comungando da presença de todos estes amiguinhos mais pequenos e ao fim do dia lembra-lhes a hora do recolher.

Nesta malha de sons, também têm lugar uns tantos exóticos, psitacideos, codornizes (as "tias"), mas também umas rolinhas australianas que já nos deram dois lindos descendentes, que colaboram em toda esta composição harmoniosa, mesmo quando são visitados por um felino devorador que já nos levou à tristeza de uma grande perda.

Atento a todo este movimento partilhando espaços e atenções com um Labrador desassossegado e amigo e um papagaio muito tenro na sua infância, habitando um chalet de tabuinhas, o “Lord” vai afinando a sua linguagem melodiosa de um príncipe bem sucedido.

É com toda esta vivência de sons puros e originais por um lado, e sons poluídos próprios de uma zona citadina e simultaneamente rural por outro, que o meu ouvido, distribuído por várias plateias, se vai educando ao ritmo de uma máquina a vapor.

Jan Kubelik plays "Zephyr" by Hubay