28 de março de 2010

Columbófilos de Beja apoiam o dia Mundial da Poesia












A satisfação era patente nos columbófilos de Beja que aceitaram de bom grado colocar os seus pombos ao serviço da cultura e das crianças. Jacinto Fialho, um dos que têm pombal junto ao Bairro das Pedreiras, diz ter gostado da experiência, sobretudo por ter "ajudado a fazer a interligação entre as comunidades rurais e os citadinos".

O seu companheiro "na aldeia dos pombais", Manuel Mareco, considera que a experiência ajudou a transmitir às crianças o gosto pela columbofilia. "Temos jovens entusiastas dos pombos que não se metem nas drogas, nem noutras porcarias do género, e até são bons alunos". 
Só deixa um lamento:

"Tínhamos um pombal na Cercibeja, mas a gripe das aves matou esta experiência e deixámos de poder ter lá os nossos pombos"
Mas, enquanto esperam pelo regresso à instituição, estão a trabalhar na criação de um pombal para uma experiência com cidadãos portadores de deficiência.

A poesia andou ontem pelos ares do Baixo Alentejo. A Biblioteca Municipal de Beja recorreu a pombos-correio para comemorar o Dia Mundial da Poesia, de forma a captar mais facilmente a sensibilidade das crianças para as palavras encadeadas e impregnadas de emoção. Dezenas de pombos transportaram ontem pelo céu muitos poemas escritos de improviso por cerca de 80 crianças da cidade de Beja e das freguesias rurais de Salvada e Santa Vitória.

Foi a partir das 10 horas, num dia com um cheirinho a Primavera, mas com o Sol meio escondido no céu nublado com poucas abertas, que os columbófilos do concelho de Beja se associaram entusiasmados à ideia lançada por Miguel Horta, "poeta, pintor e mau pescador de achigãs", como fez questão de se apresentar. O organizador da iniciativa assumiu-se como descendente de Al Mutamid, um dos poetas mais importantes do Al-Andalus (região que no período da ocupação muçulmana abrangia o Sudeste da Península Ibérica), nascido em Beja e que fazia uso dos pombos-correio para enviar mensagens às suas namoradas.
Junto ao Bairro das Pedreiras, onde residem cerca de 60 famílias, estão instalados numa pequena elevação de terreno, com vista para uma das mais extensas planícies alentejanas, uma dezena de pombais. Foi até lá que um autocarro do município transportou cerca de 40 crianças e adultos para assistirem à chegada dos pombos, primeiro da Salvada e de Santa Vitória.


 















Reforçar a identidade

Todas as pessoas que sabiam da iniciativa ficaram de nariz no ar à espera dos pombos. O entusiasmo, misturado com ansiedade, era tanto que algumas crianças já confundiam outras espécies, como melros, pintassilgos e pardais, com os esperados mensageiros, que acabaram por ir chegando como se se fizessem à pista de um porta-aviões. Os donos dos pombos sopravam um estridente apito, enquanto chocalhavam numa lata os grãos que os alimentam. Mal a ave entrava no pombal, seguia-se a correria das crianças, curiosas em receber as mensagens poéticas.


Lá estavam nas patas dos pombos, atadas em pequenos rolos de papel, as palavras que todos disputavam para uma primeira leitura.

O pequeno Moisés, que mora na Salvada e que revela grandes problemas de integração, não sabe ler nem escrever, mas a vontade puxou-lhe para as coisas do espírito e pediu a alguém para lhe desenhar as letras do poema que ia copiando: "As nuvens correm como tubarões sobre o mar". 
Alguns que o ouviam a soletrar as poéticas palavras não continham a emoção e tentavam disfarçar, com um gesto, a ténue humidade espelhada nos olhos. "Que letra tão bonita para quem não sabe escrever", disse uma jovem.

Cristina Taquelim, dinamizadora de actividades culturais para crianças, na Biblioteca de Beja, juntava os pequenos papéis com as mensagens que iam chegando, amarrotados, dobrados, escritos a lápis e a esferográfica com letras, nuns casos legível, noutros a lembrar a arte rupestre de Foz Côa, e ainda alguns exemplos de mais exigente decifração.

"O meu coração baila vermelho e alegre", leu Cristina Taquelim. A men- sagem veio no "correio aéreo" de San- ta Vitória, juntamente com outra, que deixou muitos sem palavras: "O golfinho encontrou uma menina golfinho e amou ela". Ou a de Luís Filipe, para quem "A magia pinta os sonhos do rei".

Para a técnica municipal, os pombos são uma referência cultural das populações das aldeias, logo mensageiros ideais "para reforçar a sua identidade" e para lançar o projecto Leitura em espaço rural. Já Miguel Horta pretendeu com a sua ideia colocar os "pombos a trabalhar para a cultura e, ao mesmo tempo, levar a columbofilia às crianças".
Por Carlos Dias

















Jan Kubelik plays "Zephyr" by Hubay