7 de agosto de 2007

Eça de Queirós


....."Bafos de aragem quente entravam; ouvia-se ferver a panela no fogão, e fora o martelar incessante da forja; às vezes o arrulhar triste de duas rolas que viviam na varanda, numa gaiola de vime, punha na tarde abrasada uma sensação de suavidade.
A campainha retilintou, sacudida com impaciência.

— Com a cabeça, burro! - disse Juliana.".....
..."Dos dois lados do tabique que cercava o terreno vago, agachavam-se os tetos escuros das duas ruazitas paralelas; eram casas pobres onde viviam mulheres, que pela tarde, em chambre ou de garibaldi, os cabelos muito oleosos, faziam meia à janela, falando aos homens, cantarolando com um tédio triste. Do outro lado do terreno, verduras de quintais, muros brancos davam àquele sítio um ar adormecido de vila pacata. "...
Sebastião tinha estado nos últimos três dias em Almada, na Quinta do onde trazia obras.
Voltara na segunda-feira cedo, e, pelas dez horas, sentado no poial da janela de jantar que abria para o terraçozinho, esperava o seu almoço, brincando com o Rolim - o seu gato, amigo e confidente da ilustre Vicência, nédio como um prelado, ingrato como um tirano.
"...A manhã começava a aquecer; o quintal estava já cheio de sol; na água do tanque, sob a parreira, claridades espelhadas e trêmulas faiscavam. Nas duas gaiolas os canários cantavam estridentemente.
A tia Joana, que andava a arranjar a mesa do almoço muito calada, pôs-se então a dizer com a sua vozinha arrastada e minhota:
— Ora, esteve aí ontem a Gertrudes, a do doutor, com uns palratórios, com umas tontices!...
— A respeito de quê, tia Joana? - perguntou Sebastião.
— A respeito de um rapaz, que diz que vai agora todos os dias ...."

Jan Kubelik plays "Zephyr" by Hubay