31 de março de 2009

Milheirinhas escolhem os melhores cantores

À semelhança dos humanos, a milheirinha, uma espécie de ave, procura escolher entre os machos os mais belos e os melhores cantores para acasalar, sinais de maior capacidade de criar prole.


Ambos os jogos de sedução passam pela comunicação e pela atracção exercida pela beleza corporal, esta também encarada como indicador de bons genes, de indivíduo saudável, e reprodutor mais capaz para a preservação da espécie.
Uma das grandes diferenças reside na circunstância daquela família de aves ser a fêmea a única a escolher, enquanto que nos humanos ambos têm voz activa na formação da parelha.
Paulo Gama Mota, biólogo da Universidade de Coimbra que estuda desde 1990 o comportamento sexual desses "primos" dos canários que abundam em Portugal, concluiu que o canto e as colorações mais belas dos machos são factores de atracção das fêmeas, e de estimulação dos seus comportamentos reprodutores.
Na época reprodutiva os machos tentam atrair a atenção das fêmeas com o seu chilreio, procurando bater os rivais, e estas escolhem companheiro entre aqueles que apresentam um canto mais complexo e elaborado.
"É uma verdadeira máquina canora. Os machos produzem uma grande quantidade de canto.

Conseguem produzir uma das maiores quantidades de som por unidade de tempo que nós conhecemos nas aves, e cantam em frequências muito elevadas", afirma.
A partir da análise da comunicação das aves e das suas alterações, em laboratório e ambiente natural, lançaram a hipótese de essa complexidade do canto do ponto de vista do controlo motor tornar difícil a introdução de variações ao longo do tempo.
Além desta característica sexualmente seleccionada, um outro sinal das milheirinhas é a coloração das penas, que também é diferenciadora, entre fêmeas e machos, e entre estes.
A acumulação de pigmentos nas penas das asas, que são carotenóides, diferencia também a coloração dos machos, e assim cada um se torna mais ou menos atractivo aos olhos da fêmea.
"Claramente as fêmeas preferem os machos com maior saturação de amarelo, mais coloridos", explica Paulo Gama Mota, acrescentando que ao experimentar manipular-lhes as cores elas deixaram de se interessar por eles.
Actualmente a equipa de investigadores coordenada por este biólogo procura comprovar a tese de que a coloração é também para as fêmeas um sinal de mais saúde, e um indicador de reforço do sistema imunitário dos machos.
Outro domínio que a equipa de Paulo Gama Mota pretende aprofundar são as questões relacionadas com o controlo neuronal, cerebral, do canto e da estrutura do canto.
O canto das aves tem muitas semelhanças com o desenvolvimento da linguagem nos humanos, e tem sido muito utilizado como modelo, nomeadamente nas neurociências, para perceber processos de memorização e processos de aprendizagem, explica.
"Da mesma maneira que os nossos estudos contribuem para o conhecimento dos sinais sexualmente seleccionados nas milheirinhas, também há indicadores de que há características que são sexualmente seleccionadas nos humanos e que tem uma preferência relativamente estável ao longo do tempo", salienta.
Embora os humanos vivam em ambientes cada vez menos naturais, e condicionados por legados culturais, há traços sexuais com grande estabilidade ao longo do tempo e invariáveis entre culturas, que foram seleccionados no passado evolutivo e se mantêm profundamente embebidos na arquitectura do cérebro, e continuam hoje a determinar as preferências.

por Lusa

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